SEJA BEM-VINDO

quinta-feira, 9 de abril de 2015

De abril a abril

Cada pessoa costuma ter preferência por algum mês. Eu, por exemplo, gosto muito de abril. Tenho a sensação de que o ano finalmente começa sem risco de voltar atrás. Mas não é somente isso. Tem o amanhecer, a iluminação, a temperatura um pouquinho mais amena certificando nossa saída do inferno que é Itaperuna no verão. Talvez justifique esse meu gosto uma nota cultural: desde criança carrego a convicção de que a verdadeira Páscoa, aquela com ovinhos de chocolate, bacalhau, e leite de graça ganhado nos currais dos sítios lá de Retiro do Muriaé, sempre acontecia em abril. Isso sem contar que nesse mês havia um feriado que não entendia porquê; ficava fulo da vida vendo todo mundo exortando o Tiradentes e não o Descobrimento do Brasil que eu achava muito mais importante. E ainda há Afrodite com todos os tons de cinza a que nos remete!
Entretanto, ainda hoje, maio é certamente o mês mais querido da maioria das gentes; é de Maria para os católicos do mundo inteiro, é das noivas suspirosas e de muitas outras flores. Eu acho simpático, mas nada como abril. Nem junho do meu aniversário, dum montão de santos festeiros, da paçoca e do quentão e dos arrasta-pés em chão batido é melhor que meu abril.
Já foi o tempo em que julho era adorado por todos da escola; com 180 dias de aula no calendário da educação, o mês era inteirinho um recesso. Quem podia viajava. Hoje, tanta gente pode, mas a folga ficou pequenina.
Não tenho preconceito, mas agosto... não é só a rima ou o senso comum. Talvez por ser um mês em que não há feriado em calendário nenhum; ou pelo curioso suicídio de Vargas de que, crianças, a gente ouvia os pais lamentarem, agosto é assim meio sinistro.
Ah, setembro! É meu vice-campeão! Mas eu queria mesmo que fosse hors concours. Não sei se já disse que em minha adolescência eu era apaixonado pela Vanusa. Pronto! As manhãs de setembro nunca me saem da cabeça.
O mês mais grande (tive uma vontade enorme de escrever assim) sempre foi outubro. Trinta e um dias que pareciam dois meses juntos. Então criaram um feriado nos anos de 1980. Foi para institucionalizar o Dia da Padroeira do Brasil, mas para mim, de verdade, foi pra comemorar o Dia das Crianças e o Descobrimento da América.
Acho que há muito mal entendido sobre o mês de novembro. No meu caso, as reminiscências da puberdade (ainda uso esta palavra) desenharam um tempo muito funesto e mágico. Durante anos, e até hoje, às vezes me parecia que novembro era inteiro o mês das bruxas (uma invasão outubrina). E tinha ainda a Proclamação da República que eu pensava que sempre existira. Hoje em dia, para os itaperunenses, novembro traz uma vergonha doída: o massacre sofrido pelo jovem Marcos Hirô.
Acho dezembro uma correria. É um mês que não cabe em si. O balanço revela para cada pessoa um montão de coisas prometidas e não cumpridas ou completamente esquecidas nos desvãos do ano. Parece que nos últimos trinta e um dias o motor gira a mais de 120 km por hora. Além disso, dezembro, novembro, outubro e setembro têm seus nomes equivocados no novo alinhamento; eles não são o décimo, o nono, o oitavo nem o sétimo mês do ano. Mas aí chega janeiro e muita coisa deixa de ser importante.
Conheço um montão de gente que gosta mais de férias do que de um mês. Então não importa quando, mas o gozo dos 30 dias de pernas pro ar é o que interessa. Ocorre que 99,9% dos meus amigos querem tirar férias em janeiro ou fevereiro – que foram meses inventados posteriormente para dar conta do calendário solar. Daí, esses meses ficaram muito populares. Fevereiro acho muito justo. Pra mim o Carnaval somente devia acontecer nele. Institucionalizado pelo Jorge Ben Jor. Não gosto muito, mas respeito janeiro. Por aqui, muitas vezes chuvoso, esvazia a cidade – que não é serra e nem mar – por onde os carros passam apressados rumo ao litoral.

Já março, sinceramente, ô coisinha mais sem personalidade. Pra mim ficou cravado que é um mês em que as pessoas não fazem boa interpretação do que leem. Ainda bem que abril nos socorre, logo no dia primeiro, fazendo tudo que passou parecer mentira.
Publicado na Estilo OFF - abril/2015

Nenhum comentário: