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quinta-feira, 5 de outubro de 2017

ENQUANTO NÃO VEM A CHUVA

Quando se vê, já é outubro. E o ano, que tinha começado agorinha, já tá pra virar. Em dois ou três meses – nunca se sabe ao certo, pois o tempo não é feito somente de cronologia –, que tendem a passar rapidinho, puf. Foi-se.
O último mês do ano nem se fala! É aquela sensação de que não vai dar tempo. Vai ficar pelo caminho a grande maioria dos projetos sonhados. Certa vez eu disse aqui, em OFF, que dezembro é um mês que não cabe em si. Afinal, são muitas confraternizações que preparam o Natal e, depois, o Ano Novo – uma festa que, no fim, parece pertencer mais ao ano que passou do que ao que está chegando.
Ah, novembro! Nem sabemos ao certo como acontece de haver um mês tão galopante! É uma antecipação, sem dúvida! É um making of, para dar a isso um tom anglófilo. São apenas 4 finais de semana, mas em compensação teremos 3 ou 4 feriados e, a depender da economia que os administradores da coisa pública topem fazer... pelo menos uma sexta-feira de recesso contra 17 dias úteis para sentir o pulso de quem irá sobreviver. Outubro fecha o tríduo e o final de mais um ano. Esse mês, originalmente, era mais grandalhão. Daí arranjaram um feriado para cravar quase no meio dele e isso lhe atenuou a duração. A mim, traz sempre a sensação de que estou definitivamente no segundo tempo.
Agora, em muitos lugares do mundo é primavera. Menos em Itaperuna. Aqui na pedra quente - digo, na pedra preta - sempre é meia estação. Sim, por essas bandas temos o verão-outono, verão-inverno, verão-primavera e verão-verão. Tivesse nascido no Noroeste Fluminense, Mário Quintana, para poetizar a rápida passagem do tempo, por certo teria feito umas linhas dizendo que “quando se vê, já é verão”.
Quando eu era criança, não enfrentávamos esse clima de deserto que se instalou definitivamente. O regime de chuvas era outro. Tanto que podíamos contar, praticamente durante o ano inteiro, com as poças das pancadas d’água para uma das brincadeiras de maior apelo entre a criançada: reparar o espetáculo que há nas poças d’água. O reflexo de tudo nelas. Pisá-las como num batismo de pés descalços por condição, ou por opção preferencial. E o apogeu: num movimento atlético, com a parte de baixo do pé, chutar para mandar a poça inteira de água barrenta no outro. Porque o barro torna a brincadeira mais original e emocionante. Tudo feito com uma gritaria combinada. Fazia sentido aquele catarro escorregadio limpado com as costas das mãos. A umidade relativa do ar estava sempre a nosso favor.
Eventualmente havia tempos secos. Nessas ocasiões, o Muriaé e o Carangola minguavam mostrando seus esqueletos de pedra. A serpente mansa corria límpida e esquálida no desvão das rochas. E se acreditava que fazendo procissões e rezas ao pé de um cruzeiro a chuva desceria. E nos prontificávamos com esperança. Entretanto eram raros os anos em que os períodos de estiagem se prolongavam demais como vêm sendo ultimamente. E mesmo rezando mais, e mesmo fazendo procissão de whatsapp em correntes intermináveis, a chuva cada vez demora mais, e dura menos, como se fora um castigo.
Todavia já é outubro e certamente choveu. É possível que a água da chuva, mesmo que pouca, tenha apagado da memória social o aperto das consequências e o desmazelo sobre as causas. Novamente fazendo surgir a indiferença atitudinal. Somente no ano que vem, entre junho e setembro a gente volta a se mobilizar pro lamento, pra dança e pra oração pela chuva.
Para fazer diferente desta vez a gente pode adotar um princípio confuciano bem bacana e útil: “o que eu ouço, esqueço. O que eu vejo, lembro. O que eu faço, aprendo”. Neste dia 8 de outubro, a partir das 9 horas, na Praça de Skate, todo mundo está convidado para o ABRAÇO NO RIO MURIAÉ.

Publicado na OFF - OUTUBRO/2017