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sexta-feira, 6 de junho de 2014

É sábado-feira



A mudança do local da feira livre de Itaperuna teve capítulos de uma queda de braço entre os feirantes e a prefeitura. Na verdade, nenhum dos dois lados acreditava que o novo local atrairia os clientes habituais e xepeiros tradicionais acostumados há décadas de desconforto, furdunço e abandono na avenida senador Francisco Sá Tinoco. O problema era que não tirar o livre comércio de seu antigo local não estava entre as possibilidades. A alternativa de levar a feira para a avenida deputado Cory Pillar se impunha face à retomada das obras de drenagem e esgotamento sanitário da Vinhosa. Ou seja, a transposição da feira não tem nada a ver com projeto de melhoria do trânsito ou de respeito aos feirantes e consumidores, que há décadas carecem de atenção do poder público.
Quase todo mundo mais ligado ao assunto do deslocamento da feira errou redondamente em relação à resposta dada pelo povo. Disseram que 40% dos feirantes não compareceriam no primeiro sábado no novo endereço. Houve até mesmo feirante que não se preparou para o boom de vendas ocorrido na inauguração da nova rua da feira e ficou com carão. Eu não sou muito bom de cálculos, mas frequento com certa regularidade a feira livre de nossa cidade, por isso suponho que o movimento tenha sido maior do que o historicamente registrado no antigo local. Mesmo que não tenha crescido, foi ao menos muitíssimo mais organizado. Aproveito, neste ponto, pra dizer que quem não gosta de feira é ruim da cabeça tanto quanto os que não gostam de samba.
O bom funcionamento da feira em seu novo local surpreendeu. Creio que até mesmo o secretário de agricultura do município, que entende do riscado, não acreditava nesse sucesso. Esta era uma estratégia da administração, dos secretários envolvidos, do prefeito? Claro que não! Penso que toda a discussão acabou por funcionar como marketing para o negócio do varejo popular. Acordou uma parte da população que estava esquecida da existência da feira livre todo sábado. O que já tinha, por assim dizer, caído na rotina tornou a virar novidade, renovou-se. Creio que uma reflexão sobre a apropriação dos espaços públicos vem permear o debate sobre a transferência e o funcionamento da feira em sua nova casa.
Os moradores do Loteamento João Bedim e adjacências – acho que posso falar em nome deles – receberam os feirantes de braços abertos; afinal, tê-los todos os sábados pela manhã é muito melhor do que conviver com as autoescolas e seus aprendizes de motorista durante a semana inteira e, regularmente, com o engarrafamento e perigo trazidos pelo pouco zelo do próprio Detran-RJ nos dias de exame de direção.
Há um fato interessante que passa desapercebido para muita gente que pensa a cidade. O centro comercial de Itaperuna tem se deslocado, ainda que vagarosa, mas visivelmente, em direção aos bairros Cidade Nova e Presidente Costa e Silva. De malas prontas chegaram supermercados, concessionárias de carros, agência bancária, escolas particulares, lojas de departamento talvez fugidos das enchentes que castigam ordinariamente o centro da cidade mais do que os bairros novos. Desta forma, a vinda da feira pra cá é mais um sinal.
Infelizmente, a administração municipal de Itaperuna erra até quando acerta. Desorganiza quando tenta organizar. Não fosse assim evitaria apregoar a provisoriedade da mudança do local da feira; não estaria gerando uma enorme insatisfação nos feirantes e clientes mudando as barracas de local a cada sábado – a gente fica tonto sem saber onde estão os produtos que queremos –; e, por último (espero que seja a derradeira burrice), impondo aos feirantes a taxa banheiro/lixeira (um negócio de sublocação – para não dizer outra coisa – que tem cara de malfeito). É como se a municipalidade não pudesse arcar com isso. O poder público tenta pegar carona na popularidade da feira; mas, atrapalhadamente, acaba metendo os pés pelas mãos. Ora, os feirantes, em sua maioria, são pequenos produtores com reconhecido direito à informalidade; não são caçadores anuais de níqueis como os barraqueiros da festa de 10 de maio. Por falar em festa de maio... deixemo-la pra lá.

Publicado na OFF - junho/2014

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