O maior castigo
para os que não se interessam por política é que serão governados pelos piores
políticos.
As coisas que
queremos e parecem impossíveis só podem ser conseguidas com uma teimosia
pacífica.
Arnold
Toynbee e Gandhi
Neste sete de
setembro estaremos lembrando os 191 anos da Independência do Brasil. A
narrativa tupiniquim para o começo da nação buscou reforçar uma epopeia de
heroísmo às margens do riacho do Ipiranga onde o futuro imperador de espada desembainhada
grita para o séquito a monocórdica “Independência ou morte”. A ideia que tornou
a falácia um emblema era de dar ao evento um ar de arroubo patriótico e se consubstanciar
assim em estatuto da verdade e da origem nobre da nação. De lá pra cá, as
comemorações do Dia da Independência têm sido utilizadas tanto para a falta
legalizada ao trabalho quanto para o fim de propagandear a pujança bélico-econômica
da pátria. Nisso os governos de todos os níveis sempre foram bastante competentes
e pouco criativos. Pelo país afora, repetem-se os enfadonhos desfiles cívicos
em que as escolas e outras instituições que dependem do financiamento público
marcham pelas ruas e avenidas improvisadas de desfilódromos sacudindo suas
bandeirinhas nacionais - sob sol ou chuva -, e fazendo especial deferência às
autoridades que se acotovelam com cara de paisagem nos palanques verde-amarelos
montados, em geral, com 20% de propina.
Por outro lado, a
data também tem se tornado ocasião de constrangimento para as autoridades que,
cada vez mais, veem-se obrigadas a dividir os holofotes com manifestações
sociais reivindicatórias de melhores serviços públicos, ética e competência na
administração, e os mais variados protestos contra tudo.
Há notícias pelas
redes de relacionamentos que se prepara a maior manifestação pública de todos
os tempos. Alguns dos grupos organizadores estão chamando os brasileiros daqui
e do estrangeiro para a “Operação sete de setembro” que promete “marcar a
história com um protesto que terá repercussão mundial”.
Irão se juntar aos
manifestantes de setembro muita gente que voltara a dormir. Gente que fora
expulsa das contestações pelas hordas de encapuzados mais interessadas na
desordem civil e na bandidagem beligerante que propriamente em varrer do país a
corrupção, o fisiologismo legislativo e a incompetência governamental.
Preciso lembrar que
a rua é mesmo o melhor lugar de o povo se manifestar. Nossa tradição sempre fez
dela o lócus espetacular da publicização da alegria ou da dor, tanto da
celebração da festa quanto do extravasamento da raiva. Em comparação ao
carnaval, às procissões, à Revolta da Vacina, às Diretas Já, ao Fora Collor, às
Paradas Gay, à Marcha da Maconha e a tantos
outros movimentos que se fizeram nas ruas e/ou que fazem dela seu chão, as
novas contestações têm algo de sui
generis: são mais horizontais. Não percebemos os andaimes que as sustentam.
Além disso, não conhecíamos a participação tão efetiva de um modus operandi black bloc, e muita gente
está, com razão, assustadíssima com isso. O novo anarquismo é muito mais idiota
e inconsequente. Um jovem que “descobre” o sentido para sua vida ao depredar o
patrimônio alheio ou público é a notícia mais triste do quanto nossa sociedade parece
dar marcha à ré no processo civilizatório. Uma coisa é pintar a cara de
verde-amarelo e posar bonito pras fotos – marca da moderna brasilidade
contestadora –; outra é esconder o rosto e se comportar como um zumbi
embusteiro a serviço sabe-se lá de que ou de quem.
De toda forma, que
venham as manifestações, ainda que no limite da desobediência civil, mas que
sejam como diria Gandhi: uma teimosia
pacífica, porque não aceitamos ser governados pelos piores políticos da
nação brasileira.
Publicado na Estilo OFF - setembro/2013