Muito da história político-administrativa de
Itaperuna pode ser contada na súmula feita em camadas que é a avenida Cardoso
Moreira. Pouca gente jovem sabe, mas há uma via central e um leito de estrada
férrea inteiros soterrados pela alameda que hoje, apesar de malcuidada, enfeita
o centro da cidade e ameniza, com seu correio duplo de árvores e arbustos, o
sol cáustico que paira sobre nós.
http://www.estacoesferroviarias.com.br/efl_ramais_2/itaperuna.htm |
A avenida, até o final da década de 1970, era um
elogio rendido às máquinas automotivas, poucas, mas impávidas, que serpenteavam
incólumes pelas três largas pistas. Seus privilegiados proprietários criam no
fim do transporte férreo para que a cidade “fosse limpa” dos trilhos que a
“enfeavam” e davam-lhe um ar provinciano de atraso tecnológico. A Estrada de
Ferro Leopoldina – orgulho desenvolvimentista –, inaugurada em
1881, é desativada em 1977 por motivos subterrâneos cuja explicação merecem
outra oportunidade.
No futuro, o sítio arqueológico de Itaperuna irá
contar uma história interessante de como foram os governos municipais de nossa
cidade a partir do final da ditadura militar. O corte neste período é em
respeito aos leitores contumazes desta página da OFF que não poderão se
recordar de tempos mais distantes em que ainda não eram nascidos. Além do que,
somente a partir da Constituição de 1988 é que os municípios ganham o poder de se
auto-organizar. Antes, até para arranjar um paralelepípedo da rua era preciso a
autorização do governador biônico do Estado.
Vê-se de estalo que o prefeito Claudão (1º mandato
- 1983 a 1988), ainda que apenas
no final do governo, inaugura na administração do município essa, diríamos,
vantagem competitiva: melhora a arrecadação do tesouro da cidade a partir da
autonomia fiscal trazida pela redemocratização do país e os ventos
constitucionais. Por esse tempo, forja-se talvez uma camada definitiva que é a
construção do canteiro central da Cardoso Moreira, projeto arquitetônico do
CREA, do qual nos orgulhamos, sobretudo porque criou um marco fundamental na
disputa pela ocupação do solo urbano. Mesmo com os erros que o desenho do
canteiro ainda apresenta, como é o caso da descontinuidade do calçadão para
preservação dos cortes das ruas transversais, é como se a cidadania pedestre
marcasse seu gol de placa contra a invasão dos automóveis ensandecidos.
De lá para cá, nenhuma evolução. Somente as árvores
fizeram seu papel de crescerem fortes para sombrear de ponta a ponta a artéria
fundamental da cidade. Além da iluminação de gosto duvidoso e outras
maquiagens, em 32 anos, o calçadão não recebeu a propalada ciclovia e nem o
estacionamento rotativo. Mas em compensação, ganhou um emblema: um chafariz que
é verdadeiro artefato arqueológico a céu aberto.
O símbolo em homenagem ao ex-vereador Hermes Leite
era para ser uma instalação sensitiva com ênfase na visão e na audição. Contudo
tornou-se marco da disputa mesquinha da política brasileira que tem por mote
deixar inacabadas as obras dos opositores. Quando dão continuidade ou reformam,
tentam se apropriar da autoria com o fito de apagar da memória popular o benfeitor.
Fingir que não estava vendo um chafariz agonizando no meio do caminho foi a atitude pouco republicana do prefeito Péricles em seus dois seguidos mandatos de 1997 a 2004, mesmo podendo pedir música no Fantástico. Mudou a estratégia, em 2005, o então prefeito Jair Bittencourt. Viu que tinha um chafariz no meio do caminho. “Revitalizou-o” diminuindo seu tamanho original sem calcular a pressão d’água nas serpentinas. Desse modo, no dia da “inauguração” o chafariz, que tinha ficado mais feio, se vingou molhando parte dos convidados e autoridades.
Fingir que não estava vendo um chafariz agonizando no meio do caminho foi a atitude pouco republicana do prefeito Péricles em seus dois seguidos mandatos de 1997 a 2004, mesmo podendo pedir música no Fantástico. Mudou a estratégia, em 2005, o então prefeito Jair Bittencourt. Viu que tinha um chafariz no meio do caminho. “Revitalizou-o” diminuindo seu tamanho original sem calcular a pressão d’água nas serpentinas. Desse modo, no dia da “inauguração” o chafariz, que tinha ficado mais feio, se vingou molhando parte dos convidados e autoridades.
http://www.paulorobertonews.com/2014/12/sera-que-teremos-chafariz-novamente-em.html |
O chafariz tem estórias suficientes para um romance
russo, cheio de nomes, personagens e tramas. É um túmulo aberto diante do qual
parece que os governantes preferem apertar o botão de DANE-SE.
Publicado na OFF - abril/2016