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domingo, 4 de novembro de 2012

A tevê que a gente vê



O fim de uma telenovela da rede Globo pode trazer outras revelações para além do nome de “Quem matou Max” e como cada um fica, se dá ou “termina”. Confesso que não assisti; dormi depois de um dia cheinho de trabalho e outros muitos interesses. Detalhe: com a TV ligada no canal.
O último capítulo de Avenida Brasil, dizem, alcançou 51 pontos no Ibope. Esse número parece, para a grande maioria da população, uma coisa mágica. Afinal, ele é prepotente, pois significa que sozinha, a rede Globo de televisão teve mais audiência que todas as outras juntas. Assim, até o que não era parece ser.
Dizem alguns que as ruas, praças e avenidas estavam vazias. Falam que “tudo parou” para que as pessoas assistissem à telenovela. Não posso ser cético – não quanto a isso – pois se o Ibope fosse medido aqui na cidade, teria um número mais pomposo do que este da “boa ideia”.
Mas o que essa introdução nos permite discutir um pouco nesse mês de novembro é a realidade brasileira dos meios de comunicação. Como o assunto é soberbo, busquemos um viés que me intriga: a programação das TVs abertas são sempre mais ruins – década a década – ou eu estou ficando melhor? Não deixei de ver televisão desde que, ainda criança, na década de 1970, quando uma “Empire states” de pés torneados enfeitava a sala da minha casa em Retiro do Muriaé. Para obter uma imagem com menos chuvisco e sem que o vertical ficasse rodando, usávamos chumaços de esponja de aço na antena espinha-de-peixe que era espetada num bambu gigante agarrado aos canos da caixa d’água no telhado. Ficávamos horas à frente daquela caixa mágica que parecia nos abrir os olhos para o país e o mundo inteiro. Sei lá, parece que a programação era melhor, ou então não tínhamos tantas alternativas como hoje.
Agora, a busca por audiência tornou-se o único objetivo das redes de tevê. E a concorrência exacerbada parece tê-las nivelado por baixo. Quanto maior assistência tem um programa, ou uma grade do canal, mais anunciantes e mais caros os preços dos reclames. Daí a pergunta que repito em outros termos: a programação é mais escarninha ou busca atingir o gosto popular? Venho respondendo a isso reconhecendo com tristeza que, apesar dos grandes avanços no campo educacional, a maioria da população é pouquíssimo exigente. Somente para ficar no exemplo que ainda ecoa: a trama da telenovela “Avenida Brasil” abusa da inteligência da assistência. Não estamos falando de talento artístico. Aliás, quanto a isso, há até que se perguntar quem é melhor atriz: Carminha ou Adriana Esteves? A questão é a idiotice dos argumentos da trama. É de propósito?! Penso que busca não complicar muito a vida do respeitável público. Mas, já que é assim, prefiro “Carrossel”. É mais palatável e diz logo ao que veio.
Ouso aprofundar mais o viés. Você, que agora me lê, é do tipo que tem 5 horas diárias para perder diante de uma tevê? Mesmo da tevê por assinatura?! Claro que não! Isso é mais de 50% do tempo que lhe sobra entre o trabalho e o sono. Entende, agora, por que a programação de domingo – e mesmo a de sábado – é uma @&#*a? Domingo, já diziam os Titãs, “é dia de descanso” / “Programa Sílvio Santos”. Sobra audiência pra tudo que é mídia, da melhor à pior e à inclassificável.
O fato mesmo é que a tevê aberta está cada dia mais pobre. Mais pobre, porque mais óbvia. Faça uma experiência: deixe de ver televisão durante uma semana. Quando retornar, verá que não perdeu absolutamente nada. Estará tudo igualzinho, no mesmo lugar. E pior, a programação por grade supondo um público fiel de donas de casa e crianças que acordam prontinhas para ligar a TV e ver os clichês dos programas culinários; alguns de auditório onde se desenrola um falso debate; e os filmes de “bichinhos” como já se dizia há décadas. À tarde – Ah, à tarde! – tudo um pouco pior, pois entram os enlatados de 3ª linha; os jornalísticos repetitivos e sonolentos; a encheção de linguiça e outras coisas que não valem a pena ver de novo. Haverá os que ainda se socorrem nos programas religiosos e nos de leilão de gado que não param nunca. Então vem a noite da qual, inutilmente, se espera alguma coisa.
Posso dizer que na minha adolescência a tevê ensinou muitas coisas. Havia um sentido de construção de conhecimento. As coisas ditas na mídia não eram tão descartáveis. Entretanto, para a minha envelhescência dispenso as pataquadas que a maioria dos canais oferece. A menos que seja para exercitar o humor. Quanto a isso, a tevê brasileira continua afiada. Mas o humor é mesmo uma coisa gastronômica e digestível. Faz bem assistir-lhe sentado na privada para que, ao fim de tudo, usemos a ducha íntima e demos uma longa e inexorável des–car–ga!

Publicado na Estilo OFF - novembro/2012